quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Quimioterapia em altas doses e transplante de medula óssea em mulheres com câncer de mama

Já foi moda nos Estados Unidos, após resultados de estudos iniciais. No Brasil houve muitos oncologistas que recomendavam às suas pacientes. Hoje não é mais realizado rotineiramente, após resultados de estudos mais consistentes.
Pacientes com câncer de mama sem metástases à distância, operadas, mas com alto risco de recidiva têm indicado tratamento pós operatório com quimioterapia e eventualmente hormonioterapia. Para tentar aumentar a eficácia desse tratamento, e tentar diminuir o risco de metástases durante o acompanhamento posterior, pesquisadores na década de 1990 sugeriram que bastava aumentar a dose da quimioterapia, até níveis máximos. Para que não houvesse falência da produção de sangue novo (com anemia, plaquetopenia e leucopenia irreversíveis) com essa quimioterapia em dose máxima, era necessário guardar armazenar células da medula óssea da paciente, e reinjetá-las após o tratamento. Esse procedimento é chamado "quimioterapia em altas doses e transplante de medula óssea".
Funciona bem em pacientes com determinados tipos de linfomas e leucemias.
Mas um estudo publicado nesta semana no Journal of Clinical Oncology, a mais respeitada revista científica na área de oncologia, confirmou através de uma metanálise de 15 estudos publicados, com mais de 6000 pacientes, que esta prática é inútil, e muito mais tóxica que o tratamento convencional, quando feita em pacientes com câncer de mama.
É bom saber que no início era até difícil incluir pacientes nos estudos, já que nas pesquisas as pacientes eram sorteadas para fazer ou o tratamento convencional, ou a quimioterapia em altas doses (com 50% de chance de cair em cada grupo). E poucas mulheres na época aceitavam a chance de não receber o novo tratamento. Achavam que o risco do câncer de mama voltar seria muito maior,se fizessem o tratamento convencional.  Há inclusive um excelente livro (infelizmente, encontrei apenas uma edição em inglês, aqui) sobre a falsa esperança dada pela novidade, aliada à falta de responsabilidade dos médicos na época, que recomendavam um tratamento sem evidências claras e confiáveis de benefício.
O tema não é novo, e as notícias não são boas. No entanto, a publicação deste artigo nos traz novamente a reflexão sobre como é importante fazer uma avaliação crítica das novidades médicas, os modismos, e a falta de preparo da comunidade médica em lidar com controvérsias.
Quem quiser, poder ver um resumo do artigo, em inglês, aqui.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Protetor solar reduz incidência de melanoma


A pele é o maior órgão do corpo humano e nos protege contra o calor, luz e infecções. Ela está exposta a vários agentes químicos e físicos que estão relacionados ao desenvolvimento e aparecimento do câncer, sendo o agente mais importante os raios ultravioletas solares (UV).
O câncer de pele é o tipo de câncer mais frequente, correspondendo a 25% de todos os tumores malignos registrados no Brasil. Entre todos os tipos histológicos, o mais temido é o melanoma, neoplasia originada dos melanócitos, células responsáveis pela pigmentação da pele. Embora o melanoma represente apenas 4% de todos os tumores de pele, ele é altamente agressivo e com grande capacidade de se espalhar (gerar metástases) para outros órgãos. Somente em 2010 ,foram registrados 5.930 novos casos de melanoma, no Brasil.
Embora pareça lógico o raciocínio de que o uso do protetor solar poderia proteger a pele contra os raios solares danosos e com isso diminuir o risco de câncer de pele , essa relação ainda era considerada controversa, principalmente com relação ao melanoma. A maioria dos estudos eram pequenos e conflitantes, e alguns até mostravam um aumento na incidência de melanoma nos grupos que mais usavam o protetor solar. Talvez porque esses indivíduos também eram os mais susceptivéis a câncer de pele, por serem, quase sempre ,de pele mais clara e viverem mais expostos ao sol. Entretanto,um  estudo recente , publicado em Janeiro de 2011, por uma das mais importantes revistas oncológicas, o Journal of Clinical Oncology,  parece reforçar o efeito benéfico do protetor solar na luta contra o melanoma.
Esse estudo foi conduzido por um grupo de pesquisadores australianos e seguiu 1.621 pacientes adultos, de raça branca, residentes na cidade de Nambur, na Austrália. Os pacientes, que tinham entre 25 e 75 anos, foram selecionados em 1992, e divididos aleatoriamente em 2 grupos: um grupo (812 pacientes) usaria protetor solar diariamente  na cabeça, nuca, braços e mãos; o outro grupo (809 pacientes) usaria o protetor livremente conforme o desejo de cada paciente, incluindo o não uso. O estudo durou até 1996 e os pacientes foram seguidos até 2006. O objetivo inicial era avaliar o impacto do uso do protetor solar na incidência de Carcinoma Basocelular e Carcinoma Epidermoide, tipos de câncer de pele, com altas taxas de cura, mas posteriormente, como objetivo secundário decidiu-se avaliar os efeitos sobre o melanoma. Entre 1996 e 2006 os pacientes eram avaliados e se houvesse suspeita de melanoma eram encaminhados para tratamento adequado.
Cerca de 75% dos pacientes do grupo do protetor solar aderiram ao tratamento proposto, enquanto, no grupo controle, mais de 70% não usavam protetor ou usavam com pouca freqüência. Após 15 anos de seguimento, houve o diagnóstico de melanoma em 36 pacientes entre os 1.651, sendo 11 casos no grupo que fez uso rotineiro do protetor e 22 casos no grupo controle. Houve portanto, uma redução de 50% no risco de incidência do melanoma com o uso diário de protetor solar, embora na analise estatística a significância desse resultado ainda seja discutível. Quando se analise apenas os melanomas invasivos a redução do risco foi de 73%.
Portanto, esse estudo populacional é único, nesses moldes, que acompanhou pacientes por um longo período, após serem submetidos ao uso diário de protetor solar e mostrou redução nas taxas de incidência do melanoma, em comparação com indivíduos que não fazem uso regular dessa proteção. Embora esses dados estejam de acordo com os conhecimentos sobre a carcinogênese dos tumores de pele é preciso que mais estudos sobre o assunto sejam realizados na tentativa de definir melhor o papel do protetor solar e qual o melhor momento para iniciar seu uso.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

ASCO 2011

No encontro anual da ASCO (American Society of Clinical Oncology), em junho deste ano, foram apresentados os principais trabalhos em andamento. Muitos deles ainda não foram publicados, mas refletem o caminhar do conhecimento em oncologia do mundo.
De todos os trabalhos apresentados, cinco foram considerados os de maior impacto.Dois eram em oncologia pediátrica, um em GIST (um tipo raro de tumor) e dois em melanoma.
Estes últimos foram os que chamaram mais a atenção de todos, porque podem significar um novo tratamento padrão para melanoma. 
Até hoje não havia nenhuma terapia que fosse eficaz contra essa doença - é usada nos pacientes com melanoma metastatico uma droga chamada dacarbazina, desenvolvida na década de 70, e que em 5 a 10% dos pacientes conseguia fazer os tumores encolherem, e mesmo assim por um curto espaço de tempo. Nunca se demonstrou um aumento na expectativa de vida dos pacientes.
O primeiro estudo trouxe os resultados mais impressionantes, e comparou o uso de dacarbazina versus o de uma droga de alvo molecular chamada vemurafenibe. Essa droga age em uma mutação de uma proteína chamada BRAF. Essa mutação ocorre em cerca de metade dos casos de melanoma. O estudo:
- avaliou 675 pacientes (todos com mutação do BRAF) de 103 centros de todo o mundo
- dividiu de forma aleatorizada os pacientes em dois grupos, para receber dacarbazina ou vemurafenibe
- mostrou que o grupo que recebeu vemurafenibe teve 74% de reducao do risco de progressao da doenca, mas principalmente 63% de redução do risco de morte
- 5% dos pacientes que receberam dacarbazina tiveram redução do volume de doença, em contraste aos que receberam vemurafenibe, em que essa taxa foi de 48%
Desta forma, há uma nova esperança para pacientes com melanoma metastatico. A detecção da mutação pode ser feita em laboratórios especializados, existentes no Brasil, e esperamos que o registro do medicamento para uso no Brasil e em todo mundo seja feita de forma rápida.